Para melhor compreender o processo que levou à instauração da Justiça Eleitoral, é preciso conhecer os pormenores que a antecederam, principalmente no que diz respeito ao período republicano brasileiro. Compreender um aspecto histórico tão importante quanto a criação da Justiça eleitoral empreende compreender, também, que isso ocorre de maneira gradativa e motivada por fatos que podem anteceder até décadas.

A República brasileira iniciou de maneira abrupta, mas não inesperada. O burburinho dos liberais da época e a falta de apoio da elite para com o Império já eram quase palpáveis. Nesse primeiro momento, então, a nação brasileira se inspirou no federalismo norte-americano, famoso não só pelo seu processo de independência, mas também pela forma como se organizou politicamente após se tornar independente.

Em um primeiro momento, posto que a proclamação da República ocorreu por vias militares, foram essas figuras que comandaram o Brasil, mas de modo a sempre adotar uma forma violenta e pouco democrática de governo. Após o afastamento dos militares, a política nacional passou a ser regida por aspectos econômicos, e foi quando iniciou o que os historiadores chamam de “Política do Café com Leite”.

A Política do Café com Leite consistia no apoio mútuo dos estados de São Paulo e Minas Gerais - os maiores na exportação de Café e Leite, respectivamente - ao ocuparem a cadeira presidencial, de modo que Minas Gerais sempre apoiava São Paulo e vice-versa. Após aproximadamente 30 anos desse modelo político, Minas Gerais apoiou um candidato diferente, gaúcho. Ainda assim, o candidato de São Paulo ganhou o pleito.

O candidato gaúcho, Getúlio Vargas, no entanto, não aceitou o resultado da eleição - era sabido por todos que meios como compra de votos e votos por coerção eram atividades comuns, e São Paulo sendo influente economicamente conseguia angariar uma grande quantidade de votos dessa maneira. Assim sendo e após o assassinato de seu candidato à vice-presidência, João Pessoa, Vargas destituiu o candidato Paulista e tomou o poder enquanto presidente provisório.

Dois anos após esses acontecimentos, o ainda presidente Getúlio Vargas instituiu a Justiça Eleitoral. É preciso, no entanto, compreender que a criação de tal órgão não ocorreu de maneira passiva ou por “boa vontade” de alguns políticos, mas como resultado da luta de uma população que já não aguentava mais se ver manipulada politicamente, em uma democracia que não funcionava de fato.

Desse modo, a Justiça Eleitoral foi criada para que a compra de votos e fraudes eleitorais - comuns no período da política de Café com Leite - não voltassem a ocorrer. Ademais, outras inovações foram implementadas, a legislação eleitoral também permitia voto de qualquer cidadão brasileiro maior de 21 anos, sem distinção de escolaridade ou de sexo, tornando o voto feminino legal em todo território nacional.

Outro aspecto importante foi a utilização de foto e digital no documento eleitoral, aumentando a segurança das eleições em relação à identidade do eleitor. A função da Justiça Eleitoral é e sempre foi garantir que a democracia brasileira seja respeitada, evitando fraudes e dando transparência ao processo eleitoral. O Brasil é um país pioneiro ao adotar a Justiça Eleitoral e investir em segurança no processo eleitoral.

Esse foi apenas o início da Justiça Eleitoral Brasileira, que respirou brevemente por 5 anos, até o mesmo presidente que a criou, extingui-la. Vargas, em 1937, decide estabelecer uma ditadura e monopolizar o poder nacional em sua figura, pondo fim, momentaneamente, à Justiça Eleitoral.

 

Texto de Glicia Kaliane de Souza - estagiária de história (UFRN)

ago./2021

 

 

Em 1937, a Justiça Eleitoral foi extinta pelo mesmo político que a criou e sancionou. Getúlio Vargas planejava, já há algum tempo, dar início ao golpe que culminaria nas medidas autoritárias do Estado Novo. E para tanto era necessário dar fim ao meio que garantia a elegibilidade confiável em território nacional: a Justiça Eleitoral. Vargas fechou o congresso e assembleias, também nomeando interventores estaduais e municipais.

O fechamento dessa instituição durou oito anos (1937-1945), período também de duração do Estado Novo. O Brasil passou a atuar ao lado dos aliados na Segunda Guerra Mundial, o que fez parte da população questionar os motivos do Brasil apoiar um autoritário enquanto ajudava a derrubá-los do outro lado do mundo. Em 1945, então, a Justiça Eleitoral é reinstalada e volta a vigorar em todo Brasil. Da mesma forma como ocorreu na 1ª fase, a reinstalação não ocorreu de forma igual, cada Estado reinstalou o Seu Tribunal Regional Eleitoral conforme as condições possibilitaram, por este motivo pode ser visto, acessando o site dos demais Tribunais Eleitorais, datas diferentes de reinstalação.

Dez anos após reinstalada, em 1955, medidas de segurança foram aplicadas às cédulas eleitorais, não estava mais a cargo dos partidos as impressões das cédulas eleitorais, tal responsabilidade passou a ser do Tribunal Superior Eleitoral e neste mesmo ano teve foi apresentada o modelo de cédula única que iria ser utilizada na próxima eleição.A Justiça Eleitoral sempre buscou desenvolver métodos para garantir a validade, segurança e correta aplicação das leis eleitorais.

Com o golpe militar ocorrido no ano de 1964, o pluripartidarismo logo foi extinto, bem como as eleições estaduais e municipais. Desse modo, pode-se dizer que apesar de não ter sido extinta, a Justiça Eleitoral passou a ter um papel quase figurativo. Cuidar de pequenas eleições em municípios do interior do país, eleições indiretas dentro do Congresso e alteração das leis eleitorais às vontades dos militares governantes foi o papel interpretado pela Justiça Eleitoral até 1979.

Nove anos antes do regime militar acabar de fato, teve início o processo de redemocratização no país. Por volta de 1981 o Tribunal Superior Eleitoral iniciou estudos para garantir cada vez mais a segurança e transparência do processo eleitoral, que no futuro resultaria nas urnas eleitorais eletrônicas que hoje é motivo de orgulho para os brasileiros e símbolo de pioneirismo no exterior.

A Justiça Eleitoral foi uma instituição de extrema importância no processo de redemocratização nacional, garantindo que tudo estivesse dentro da legalidade e reestruturando o código eleitoral com base na nova Constituição Federal, promulgada em 1988. Um ano depois, a redemocratização foi concluída com a eleição direta, do povo brasileiro, de um presidente após 29 anos.

Atualmente a principal função do Tribunal Superior Eleitoral e dos Tribunais Regionais Eleitorais continua sendo a de: garantir a elegibilidade e legalidade de políticos e do processo eleitoral, guardiã da democracia. Lembrando que os órgãos da Justiça Eleitoral executam três funções: Função Administrativa (enquanto organizadora do processo eleitoral antes das eleições), Função Consultiva ( enquanto responde às consultas referente ao processo eleitoral) e Função Jurisdicional (enquanto julga os processos referentes ao processo eleitoral).

Apesar de ter o mesmo objetivo de quando foi criado, décadas atrás, o trabalho da Justiça Eleitoral caminhou com a modernidade. Hoje, as eleições são realizadas na urna eletrônica com auxílio da tecnologia de biometria, impedindo que alguém possa votar mais de uma vez ou ser substituído em alguma seção eleitoral.

O trabalho da Justiça Eleitoral está diretamente relacionado com a sociedade como um todo, de modo simbiótico. Sem a Justiça Eleitoral para regulamentar o processo de votação, seria mais fácil burlar o processo, como acontecia no início do século XX com o Coronelismo e Voto de Cabresto. Em contrapartida, a democracia está constantemente em perigo e cabe aos cidadãos realizar boas escolhas nas urnas. A sociedade e a Justiça Eleitoral são dois jogadores torcendo pelo mesmo time: a democracia.

 

Texto de Glicia Kaliane de Souza - estagiária de história (UFRN)

ago./2021