2.2.2. Candidatura fictícia em fraude à cota de gênero
ELEIÇÕES 2020. RECURSO ELEITORAL. AÇÃO DE IMPUGNAÇÃO DE MANDATO ELETIVO - AIME (ART. 14, §§ 10 E 11, DA CF). FRAUDE. BURLA À COTA DE GÊNERO (ART. 10, § 3º, DA LEI DAS ELEIÇÕES). SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA. SUPOSTA SIMULAÇÃO DE CANDIDATURAS FEMININAS. ALEGAÇÕES DE VOTAÇÃO INEXPRESSIVA OU ZERADA, INEXISTÊNCIA DE PROPAGANDA ELEITORAL E MOVIMENTAÇÃO CONTÁBIL. NÃO DEMONSTRAÇÃO DO ILÍCITO. AUSÊNCIA DE PROVA ROBUSTA ACERCA DO PRÉVIO E DELIBERADO INTENTO FRAUDULENTO. PRESENÇA APENAS DE ELEMENTOS INDICIÁRIOS. INCOMPATIBILIDADE COM O DECRETO CONDENATÓRIO PERSEGUIDO. INCIDÊNCIA DO PRINCÍPIO DO "IN DUBIO PRO SUFRAGIO". PRESERVAÇÃO DA SOBERANA VONTADE DO ELEITOR. JURISPRUDÊNCIA. DESPROVIMENTO.
1- Recurso aviado contra sentença de improcedência em AIME fundada na alegação de fraude à cota de gênero, levada a cabo mediante suposta simulação de 5 (cinco) candidaturas femininas, em ordem a burlar o comando inserto no art. 10, § 3º, da Lei n 9.504/1997 (Lei das Eleições).
- Da fraude à cota de gênero
2- Como fundamento autônomo para o ajuizamento da AIME (art. 14, §§ 10 e 11, da CF), a fraude tem conceito aberto e deve ser interpretada de forma ampla, não se limitando às questões atinentes ao processo de votação, podendo englobar todas as situações em que a normalidade das eleições e a legitimidade do mandato eletivo sejam afetadas por ações fraudulentas, inclusive nos casos de fraude à lei, o que abarca, decerto, a imputação de burla ao art. 10, § 3º, da Lei 9.504/1997 (Lei das Eleições), cuja ratio é ampliar a participação das mulheres no processo político-eleitoral, com vistas à concretização dos princípios da igualdade, da cidadania e do pluralismo político (TRE/RN, RE nº 0600001-98.2021.6.20.0012/Nova Cruz, j. 7.4.2022, rel. Juiz Marcello Rocha Lopes, DJe 12.4.2022).
- Caso concreto
3- Da análise dos autos em cotejo com a jurisprudência concernente à matéria, dessume-se - tal qual o douto Juiz Eleitoral sentenciante - que as impugnações "não encontram suporte probatório robusto nos autos capaz de autorizar a assertiva de que [quaisquer da impugnadas] atuaram com a maldosa intenção de burlar a sistemática da cota de gênero, estabelecida no art.10, §3º, da Lei 9504/97".
4-A uma, porque, por ocasião do julgamento Recurso Eleitoral nº 0600005-61.2021.6.20.0069/NATAL, em 1º de setembro de 2022 (de minha relatoria, pub. no DJe de 5.9.2022), esta Corte Eleitoral, sob a diretriz de inúmeros precedentes, assentou que "a falta de propaganda eleitoral, de movimentação de recursos ou a votação zerada não são elementos aptos a, por si sós, deixarem evidente a prática de fraude à lei." (TRE/RN, RE nº 0600421-28.2020.6.20.0016/São Bento do Trairi, j. 24.3.2022, rel. Desembargador Cláudio Manoel de Amorim Santos, DJe 28.3.2022). Explicou-se, naquela ocasião, que, para além de circunstâncias desse jaez, de índole essencialmente indiciária, o reconhecimento do caráter burlista das candidaturas femininas apontadas como fictícias exige "a presença de um conjunto probatório robusto e coeso, do qual se possa extrair, com a necessária certeza, ‘que os registros de candidaturas femininas tiveram o objetivo precípuo de burlar o telos subjacente ao § 3º do art. 10 da Lei nº 9.504/97' (REspe nº 0602016-38/PI, j. 4.8.2020, rel. Min. Tarcísio Vieira de Carvalho Neto, DJe 1º.9.2020).".
5- A duas, porque o apoio a outro candidato ao cargo de Vereador, circunstância potencialmente apta a corroborar aqueloutras de cariz indiciário, em ordem a confirmar a burla à norma que estatuiu o sistema de cotas nas candidaturas proporcionais, na espécie, deu-se em contexto de desistência tácita das candidaturas femininas apoiadoras.
6- Diante de dúvida razoável sobre o propósito previamente deliberado de fraudar a regra que exige a reserva de vagas por gênero no registro de candidaturas, é de rigor privilegiar o princípio do in dubio pro sufragio, sob o signo do qual não é dado à Justiça Eleitoral atribuir relevo e eficácia a juízos meramente conjecturais, para, com fundamento neles, apoiar um inadmissível decreto de cassação do diploma (TRE/RN, RE nº 0600109-98.2020.6.20.0033/Mossoró, j. 25.8.2022, de minha relatoria, DJe 29.8.2022).
7- Em tal cenário, destarte, a manutenção da sentença de improcedência é de rigor.
(RECURSO ELEITORAL nº 060000391, Acórdão de 19/12/2022, Rel. Fernando de Araújo Jales Costa, publicação de Diário de Justiça Eletrônico de 24/01/2023)
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RECURSO ELEITORAL. ELEIÇÕES 2020. PLEITO PROPORCIONAL. AÇÃO DE IMPUGNAÇÃO DE MANDATO ELETIVO. SUPOSTA FRAUDE À COTA DE GÊNERO. PROCEDÊNCIA EM PRIMEIRO GRAU. PRELIMINAR DE NULIDADE DA SENTENÇA. REJEIÇÃO. EMBUSTE OU CONLUIO COM O FIM DE BURLAR A REGRA PREVISTA NO § 3º DO ART. 10 DA LEI N.º 9.504/97. INOCORRÊNCIA. AUSÊNCIA DE UTILIZAÇÃO DA CANDIDATURA FEMININA COMO INSTRUMENTO PARA VIABILIZAR O ÊXITO DE CAMPANHA MASCULINA. DESISTÊNCIA TÁCITA DA CANDIDATURA. CONTEXTO PECULIAR VIVENCIADO NA PANDEMIA DA COVID-19. AUSÊNCIA DE QUEBRA DA PARIDADE ENTRE HOMENS E MULHERES PRETENDIDA PELO LEGISLADOR. NECESSÁRIA REFORMA DA SENTENÇA ATACADA. PROVIMENTO.
1. Recurso eleitoral que discute sentença de procedência em ação de impugnação de mandato eletivo com fundamento em suposta fraude à cota de gênero.
Previamente
2. Em tema de nulidades, prevalece no Direito Processual Civil pátrio o princípio da instrumentalidade das formas e dos atos processuais, que prescreve o aproveitamento dos atos processuais, ainda que realizado por meio diverso do previsto em lei. Tal princípio, por sua vez, não é absoluto, porquanto se subordina aos princípios da finalidade e da ausência de prejuízo (pas de nullité sans grief), segundo os quais a preservação do ato processual praticado de modo diverso do estabelecido em lei depende do alcance de sua finalidade essencial e da inexistência de prejuízo ao direito das partes, como se extrai dos arts. 188, 277, 278, 282 e 283 do Código de Ritos. Ao tratar do tema das nulidades da votação, o Código Eleitoral segue a mesma linha principiológica da legislação processual civil, consoante a previsão inserta em seu art. 219.
3. No que concerne ao depoimento pessoal, o Tribunal Superior Eleitoral firmou a compreensão de que tal ato processual é dispensável no âmbito da ação de investigação judicial eleitoral, por ausência de previsão legal e diante do caráter indisponível dos interesses envolvidos, não constituindo a sua ausência causa de nulidade no processo eleitoral (TSE, Recurso Ordinário Eleitoral nº 224688, rel. Min. Ricardo Lewandowski, DJE 04/10/2022; TSE, Ação de Investigação Judicial Eleitoral nº 060177905, rel. Min. Luis Felipe Salomão, DJE 11/03/2021). Tal entendimento pode ser perfeitamente aplicável à ação de impugnação de mandato eletivo, que não dispõe de rito expresso previsto na legislação eleitoral, ante a possibilidade de utilização, por analogia, do procedimento previsto para a AIJE.
4. Na hipótese em tela, os recorrentes Arituza Costa de Azevedo e Antônio Marcos Toledo Xavier levantam a prejudicial de nulidade da sentença, ao argumento de que o extravio da mídia digital contendo os seus depoimentos pessoais, colhidos na audiência de instrução realizada neste feito, afrontaria os princípios constitucionais do contraditório e da ampla defesa, por prejudicar a correta análise do recurso por esta Corte Eleitoral.
5. Em que pese o extravio do arquivo digital contendo a gravação da audiência de instrução realizada nesta demanda, na qual foram colhidos unicamente os depoimentos de Arituza Costa de Azevedo e Antônio Marcos Toledo Xavier, esse fato, ao contrário do que aduzem os recorrentes, não enseja a nulidade da sentença de primeiro grau nem tampouco a repetição do ato judicial perdido.
6. Com efeito, nos termos da jurisprudência consolidada do Tribunal Superior Eleitoral, o depoimento pessoal da parte constitui providência facultativa e dispensável em sede de ação de investigação judicial eleitoral, ante a ausência de previsão do referenciado ato no rito estabelecido no art. 22 da LC n.º 64/90 e o caráter indisponível dos interesses envolvidos, entendimento que também se aplica à ação de impugnação de mandato eletivo, como anteriormente ressaltado.
7. Relativamente ao depoimento do impugnado Antônio Marcos Toledo Xavier, é oportuno asseverar que a referida parte fora ouvida nas duas demandas conexas, isto é, tanto neste feito quanto no REl 0600989-85.2020.6.20.0020, tendo sido extraviado unicamente o depoimento realizado nesta demanda e permanecendo hígidas as declarações prestadas pelo recorrente naquele último, o que torna insubsistente a invocada mácula suscitada pelos recorrentes.
8. No que tange ao extravio das declarações prestadas por Arituza Costa de Azevedo, colhidas unicamente nesta ação, cujos arquivos da audiência de instrução restaram perdidos por problemas técnicos, é importante se ter em mente que a realização do depoimento pessoal constitui um meio de defesa da parte impugnada, na vertente da autodefesa, cuja falta pode ser perfeitamente suprida pelas manifestações defensivas escritas apresentadas ao longo do processo pela parte demandada, em homenagem ao princípio da instrumentalidade das formas que vigora no sistema processual civil pátrio (arts. 188 e 277 do CPC). Esse é o cenário que se esquadrinha na presente situação, já que Arituza Costa de Azevedo apresentou argumentos defensivos em sede de contestação e em alegações finais, estas últimas apresentadas após a instrução processual e com referências expressas ao conteúdo do quanto foi dito pela impugnada em juízo, documentos que se revelam suficientes para o adequado exercício do direito de defesa constitucionalmente assegurado e o suprimento do posterior sumiço do depoimento pessoal prestado no feito. Na própria peça recursal, inclusive, os suplicantes fazem alusão aos respectivos depoimentos, o que torna desnecessária, por economia processual e por inexistência de prejuízo ou mácula à ampla defesa (art. 282, § 1º, do CPC e art. 219 do CE), a repetição do prefalado ato processual no presente feito.
9. Diante desse cenário, em homenagem aos princípios da instrumentalidade das formas e da inexistência de nulidade sem prejuízo (pas de nullité sans grief), é de rigor a rejeição da prejudicial de nulidade por cerceamento de defesa suscitada pelos recorrentes no processo.
Mérito
10. A Ação de Impugnação de Mandato Eletivo (AIME), prevista no art. 14, §§ 10 e 11 da CRFB/88, constitui ação de índole cível-constitucional que visa resguardar a lisura, o equilíbrio e a legitimidade do pleito contra interferências decorrentes de abuso de poder econômico, corrupção ou fraude. O Tribunal Superior Eleitoral firmou entendimento no sentido de que é cabível apurar, mediante ação de impugnação de mandato eletivo, eventual ocorrência de fraude à cota de gênero prevista no art. 10, § 3º, da Lei n.º 9.504/97 (TSE, Recurso Ordinário Eleitoral nº 060190261, rel. Min. Benedito Gonçalves, DJE 18/10/2022).
11. No atinente à comprovação do abuso de poder político mediante fraude à cota de gênero, a jurisprudência exige a presença de prova segura e inequívoca (o que se convencionou chamar de "prova robusta"), sobre a qual não pairem dúvidas, acerca do efetivo intento de burlar a regra prevista no art. 10, § 3º, da Lei n.º 9.504/97, que assegura um percentual mínimo de candidatura por gênero, no intuito de alavancar a participação das mulheres na política, ante o histórico de alijamento da figura feminina nessa seara, com espeque nos postulados constitucionais da igualdade, do pluralismo político, da cidadania e da dignidade da pessoa humana (TSE, Recurso Ordinário Eleitoral nº 060190261, rel. Min. Benedito Gonçalves, DJE 18/10/2022; TSE, Recurso Ordinário Eleitoral nº 060169322, rel. Min. Luis Felipe Salomão, DJE 22/04/2021; TRE/RN, Recurso Eleitoral nº 060000561, rel. Fernando de Araújo Jales Costa, DJE 05/09/2022).
12. Ademais, das premissas estabelecidas pela Corte Superior Eleitoral no leading case oriundo do Município de Valença/PI (Respe n.º 193-92, rel. Min. Jorge Mussi, DJE 04/10/2019), extrai-se que, para a procedência do pedido contido em AIJE ou AIME baseada em fraude à cota de gênero, é imprescindível que esteja demonstrado um inequívoco e efetivo prejuízo à isonomia entre homens e mulheres pretendida pelo legislador, decorrente de uma intencional burla ao preenchimento do percentual mínimo, sob pena de se tolher ou desestimular a já tímida e precária participação das mulheres no campo político. A quebra da pretendida paridade entre homens e mulheres revela-se presente sobretudo quando evidenciado, de modo inequívoco, ter a(s) candidatura(s) feminina(s) servido de instrumento para viabilizar o êxito de campanha(s) de candidato(s) do sexo masculino, numa verdadeira situação de subserviência entre uma e outra, não sendo suficiente, à sua caracterização, a desistência tácita da candidatura pela concorrente mulher, diante das dificuldades inerentes à disputa eleitoral e que estejam dissociadas da questão de gênero, ou ainda, a pequena proporção das campanhas femininas (votação pífia ou zerada, ausência ou singela arrecadação ou gastos de recursos, etc), as quais são frutos da histórica desigualdade existente entre homens e mulheres no campo político.
13. É bem verdade que, em julgados mais recentes, a Corte Superior Eleitoral parece ter recrudescido na apuração e repressão à fraude à cota de gênero, por conferir relevo a elementos indiciários que, na compreensão daquele sodalício, são capazes de, em conjunto, evidenciar a burla ao art. 10, § 3º, da Lei n.º 9.504/97, à exemplo da obtenção de votação ínfima ou zerada, da prestação de contas sem movimentação financeira, da ausência de atos efetivos de campanha, dentre outros. No entanto, em diversos desses arestos, o Tribunal Superior Eleitoral, apesar do preenchimento dos referidos requisitos, ressalva as situações em que estejam presentes elementos indicativos de se tratar de desistência tácita da competição, que afasta a configuração da burla ao percentual mínimo de gênero (TSE, Tutela Cautelar Antecedente nº 060034102, rel. Min. Sergio Silveira Banhos, DJE 18/10/2022; TSE, Agravo em Recurso Especial Eleitoral nº 060085737, rel. Min. Carlos Horbach, DJE 18/10/2022; TSE, Agravo em Recurso Especial Eleitoral nº 060043316, rel. Min. Mauro Campbell Marques, DJE 15/09/2022).
14. Não por outro motivo, este Regional "consolidou entendimento de que votações ínfimas ou zeradas e a eventual ausência de movimentação de recursos de campanha, mesmo quando em contexto com a singeleza do engajamento na disputa político-eleitoral, constituem circunstâncias meramente indiciárias, as quais, conquanto possam render ensejo à apuração dos fatos sob a ótica da fraude/abuso, não são suficientes para, isoladamente (isto é, sem a corroboração por outros elementos objetivos de convicção), induzir à segura conclusão de que houve o registro de candidaturas com o intuito deliberado de burlar a política afirmativa estabelecida no art. 10, § 3º, da Lei das Eleições, até porque a desistência tácita de participar do pleito por motivos íntimos e pessoais constitui hipótese factível, circunscrita ao plano da experiência ordinária. Nesse exato sentido, confiram-se: RE nº 0600416-44.2020.6.20.0068/Lajes Pintadas, j. 5.7.2022, rel. Juiz José Carlos Dantas Teixeira de Souza, DJe 8.7.2022; RE nº 0600115-08.2020.6.20.0033/Mossoró, j. 10.3.2022, rel. Juiz Marcello Rocha Lopes, DJe 15.3.2022; RE nº 0600576-76.2020.6.20.0001/Natal, j. 5.10.2021, de minha relatoria, DJe 7.10.2021." (TRE/RN, Recurso Eleitoral nº 060000124, rel. Fernando de Araujo Jales Costa, DJE 23/08/2022)
15. Na espécie, os recorrentes insurgem-se contra a sentença proferida pelo magistrado de primeiro grau, que julgou procedente o pedido formulado em ação de impugnação de mandato eletivo proposta proposta por Rayssa Aline Batista de Araújo, candidata ao pleito proporcional pelo Partido dos Trabalhadores em Currais Novos/RN, por entenderem que "restou comprovado, através dos depoimentos pessoais dos recorrentes, que a candidata Arituza Costa de Azevedo, em razão de motivos pessoais, dentre os quais o retorno ao trabalho presencial como professora de uma escola particular em Natal juntamente com a burocracia enfrentada na campanha eleitoral, teria desistido tacitamente de sua candidatura, o que não pôde ser formalizado perante a Justiça eleitoral em razão da intempestividade na apresentação do pedido de substituição pelo partido político".
16. Na sentença guerreada, o juízo de primeiro grau consignou que "Em suma, do conjunto de circunstâncias aptas a comprovar a fraude na reserva de gênero, com base no acervo probatório levantado, serviram para amparar a minha convicção as seguintes: 1) A candidata ARITUZA não obteve um único voto, nem mesmo o dela; 2) ARITUZA é cunhada do candidato eleito ANTÔNIO MARCOS, inexistia qualquer animosidade entre eles, sendo certo que ela trabalhou na campanha eleitoral do mesmo em 2016 (e provavelmente em 2020); 3) coincidência de versões apresentadas nas defesas de ARITUZA e ANTÔNIO MARCOS, o que reforça que confeccionaram em conluio a candidatura fictícia, apenas para cumprir formalmente a cota de gênero exigida em lei; 4) ausência de formalização de renúncia de sua candidatura perante o partido e a Justiça Eleitoral. 5) ausência de comunicação da suposta desistência ao partido, para que viabilizasse a sua substituição; 6) a candidata ARITUZA não reside em Currais Novos e não comprovou a sua participação presencial ou virtual em nenhum ato de campanha, assim como não demonstrou que realizou propaganda nas redes sociais; 7) A prestação de contas da candidata ARITUZA não registra qualquer movimentação financeira, nenhuma arrecadação ou despesa, o que indica que o abandono da campanha deu-se antes do seu início; 8) a candidata ARITUZA confessou que não distribuiu nenhum material de propaganda eleitoral, apesar de ter recebido do partido, o que foi objeto de pedido de depósito em juízo".
17. Por mais que a conjuntura fática que embasou a formação da convicção do magistrado a quo contenha, num primeiro olhar, elementos indiciários no sentido de que a formalização da candidatura da Senhora Arituza Costa de Azevedo fora efetivada de forma fraudulenta, outros aspectos fáticos, não considerados pelo magistrado de primeiro grau, merecem ser valorados nesta oportunidade, por indicarem ter havido uma desistência tácita da candidatura, em contrariedade à tese de fraude sustentada na inicial.
18. Inicialmente, ao contrário do quanto concluíra o juízo a quo, não é relevante, para o deslinde da controvérsia aqui apurada, o fato de Arituza Costa de Azevedo ter realizado campanha em favor de Antônio Marcos Toledo Xavier durante as Eleições 2016, já que o presente feito versa sobre a campanha municipal de 2020, em relação à qual, de fato, inexistem elementos probatórios nos autos que denotem ter a candidata efetuado propaganda ou ato de promoção em benefício da candidatura daquele. Em nenhum dos depoimentos colhidos, houve relato de que Arituza Costa Xavier realizou campanha ou pediu votos em favor de Antônio Marcos Toledo Xavier, não se podendo presumir que, pelo fato de ela ter trabalhado em favor da campanha deste último nas Eleições 2016, na qual ela não disputava, provavelmente também tenha atuado em prol de Antônio Marcos no pleito de 2020, como discorrido na sentença.
19. Outro aspecto valorado na sentença, que não fortalece a versão delineada na exordial, refere-se aos apontamentos de que "ARITUZA reside e trabalha na cidade de Natal e não veio a Currais Novos nem para participar da convenção partidária, registrando a sua presença por meio de videoconferência". A uma porque o conceito de domicílio eleitoral é mais elástico do que o de domicílio civil, a autorizar que candidatos postulem candidaturas em municípios nos quais não tenham firmado residência. A duas em função de que, por conta do contexto pandêmico vivenciado no ano de 2020, o Tribunal Superior Eleitoral, após autorização concedida pela Emenda Constitucional n.º 107/2020 (art. 1º, § 3º, III), regulamentou a realização de convenções partidárias em formato virtual nas Eleições 2020, por meio da Resolução TSE n.º 23.623/2020, de sorte que a participação da candidata de forma remota, no ato convencional realizado pelo DEM em Currais Novos na data de 13/09/2020, não constitui indicativo relevante para a elucidação do ilícito aqui apurado, por ter havido o mero exercício de um direito respaldado pela legislação eleitoral.
20. Resta incontroverso no feito que os demais impugnados, em sua maioria, não conheciam a candidata Arituza Costa de Azevedo e não visualizaram a realização de atos de campanha pela concorrente, seja na rua ou em suas redes sociais, nem tampouco o comparecimento da candidata em comícios e outros atos políticos presenciais promovidos pela candidatura majoritária do partido, tendo sido notada unicamente a sua participação na convenção partidária do DEM em Currais Novos, que ocorreu de forma remota. Não obstante a prefalada conjuntura fática delineada no processo, não há como reconhecer nesta hipótese concreta, de modo seguro e sem margem para dúvidas, a existência de fraude à cota de gênero, principalmente diante do contexto peculiar vivenciado na campanha para o pleito de 2020, por conta da pandemia desencadeada pelo vírus da COVID-19.
21. Ouvido em juízo, o presidente municipal do DEM em Currais Novos afirmou que não acompanhou de perto a campanha de 2020 em Currais Novos/RN, por ter sido designado para atuar como coordenador da campanha de Álvaro Dias para Prefeito do Município de Natal/RN. Apesar de sua atuação no pleito municipal em Natal/RN, o representante partidário confirmou terem sido dadas condições igualitárias a todos os 10 (dez) concorrentes ao pleito proporcional daquela localidade, com a confecção de material impresso (santinhos) e adesivo para carro em favor de todos os candidatos, material que, segundo mencionou, fora custeado pela candidatura majoritária, além da contratação de advogado e contador. Mencionou, ainda, que realizou publicação, em sua rede social, contendo propaganda em favor de todos os candidatos a vereador, inclusive em prol da campanha de Arituza Costa de Azevedo.
22. Outrossim, cumpre acentuar particularidade relevante que torna distinta esta demanda dos precedentes do TSE, nos quais houve o reconhecimento de fraude à cota de gênero: apesar do incontroverso parentesco de cunhadio existente entre Arituza Costa de Azevedo e Antônio Marcos Toledo Xavier, a candidatura da recorrente não serviu de instrumento para o êxito da campanha de seu cunhado, posto que, como dito, não há nos autos um único elemento de prova que demonstre ter Arituza pedido votos ou realizado campanha em favor de Antônio Marcos.
23. Na espécie em apreço, a candidata reconhece a pretensão inicial de realizar efetivamente uma campanha política em benefício próprio, a qual restou abortada por motivos pessoais e por barreiras inerentes ao processo eleitoral, em especial pelo fato de, na época, lecionar em uma escola particular em Natal/RN e ter que retornar, logo no início do período de campanha, ao trabalho presencial, disso não resultando, de modo automático, em quebra na isonomia entre homens e mulheres pretendida pelo legislador, como defende o recorrido. As circunstâncias de não ter havido uma renúncia formal nem a apresentação tempestiva de um pedido de substituição não devem ser valoradas com tanto rigor nesta situação concreta, sobretudo diante das já citadas restrições vivenciadas no contexto da pandemia da Covid-19, que teve seu auge no ano de 2020.
24. No que se referem aos demais aspectos fáticos apontados na peça inicial e considerados na sentença, relacionados a: i) votação zerada; ii) inexistência de atos de campanha; iii) inocorrência de arrecadação de recursos ou de realização de gastos eleitorais; não passam de meros indícios da alegada fraude à cota de gênero, os quais, dissociados de prova inequívoca do intuito de burla à regra prevista no § 3º do art. 10 da Lei n.º 9.504/97, não são aptos à procedência do pedido veiculado nesta demanda impugnativa, nos moldes dos reiterados precedentes apreciados por este Regional (Ação De Impugnação De Mandato Eletivo nº 060000124, rel. Fernando de Araújo Jales Costa, DJE 23/08/2022; Recurso Eleitoral nº 060062936, rel. Fernando de Araújo Jales Costa, DJE 08/07/2022; Ação de Investigação Judicial Eleitoral nº 060041644, rel. José Carlos Dantas Teixeira de Souza, DJE 08/07/2022; Ação de Investigação Judicial Eleitoral nº 060058378, rel. Adriana Cavalcanti Magalhães Faustino Ferreira, DJE 28/06/2022).
25. É preciso que a Justiça Eleitoral esteja atenta às nuances dos casos concretos que lhe venham a ser submetidos a julgamento, sob pena de, buscando assegurar categoricamente o cumprimento do percentual de gênero previsto no art. 10, § 3º, da Lei n.º 9.504/97, desincentivar a participação feminina na política, historicamente já tão pequena. Não é razoável que, em ações cassatórias, subvertendo a lógica processual, as candidatas mulheres sejam instadas a comprovar a realização de atos de campanha, em uma inadvertida inversão do ônus probante, pois ao autor incumbe a demonstração, por meio de prova robusta, do fato constitutivo de seu direito, no caso, a burla ao percentual de gênero previsto no art. 10, § 3º, da Lei das Eleições, não sendo devida, sem uma justificativa plausível, a transferência desse dever à parte ré. Não parece democrático afastar, com base em elementos indiciários, uma candidatura legitimamente eleita, além de tornar inelegíveis dois candidatos, um deles do gênero feminino, sem um conjunto probatório robusto que ampare a tese deduzida na exordial.
26. As especificidades anteriormente apontadas justificam o acolhimento da pretensão recursal e a reforma da sentença exarada pelo magistrado de primeiro grau, o qual concluiu pela configuração da fraude à cota de gênero, em situação na qual se evidencia unicamente uma desistência tácita de candidatura feminina, sem a quebra da salutar isonomia que deve imperar entre homens e mulheres.
27. Nessa perspectiva, uma vez que o conjunto probatório existente nesta demanda impugnativa não evidencia, com a segurança e a certeza necessárias, a suposta fraude à cota de gênero, de rigor o acolhimento da pretensão de reforma trazida com o recurso para modificar a sentença impugnada, que julgara procedentes os pedidos contidos nesta demanda eleitoral.
28. Provimento do recurso.
(RECURSO ELEITORAL nº 060098677, Acórdão de 30/11/2022, Rel. Juiz José Carlos Dantas Teixeira De Souza, publicado no Diário de Justiça Eletrônico de 02/12/2022)
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ELEIÇÕES 2020. RECURSO ELEITORAL. AÇÃO DE IMPUGNAÇÃO DE MANDATO ELETIVO - AIME (ART. 14, §§ 10 E 11, DA CF). FRAUDE. BURLA À COTA DE GÊNERO (ART. 10, § 3º, DA LEI DAS ELEIÇÕES). SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA. PREJUDICIAL DE NULIDADE PROCESSUAL. REJEIÇÃO. PREFACIAL DE REQUERIMENTO DE JUNTADA DE DOCUMENTOS EM FASE RECURSAL. INDEFERIMENTO. PREFACIAL DE IMPUGNAÇÃO À REJEIÇÃO DE CONTRADITA. TRANSFERÊNCIA PARA O MÉRITO. MÉRITO. SUPOSTA SIMULAÇÃO DE CANDIDATURA FEMININA. ALEGAÇÕES DE VOTAÇÃO ZERADA, INEXISTÊNCIA DE PROPAGANDA ELEITORAL E MOVIMENTAÇÃO CONTÁBIL. NÃO DEMONSTRAÇÃO DO ILÍCITO. AUSÊNCIA DE PROVA ROBUSTA ACERCA DO PRÉVIO E DELIBERADO INTENTO FRAUDULENTO. PRESENÇA APENAS DE ELEMENTOS INDICIÁRIOS. INCOMPATIBILIDADE COM O DECRETO CONDENATÓRIO PERSEGUIDO. INCIDÊNCIA DO PRINCÍPIO DO IN DUBIO PRO SUFRAGIO. PRESERVAÇÃO DA SOBERANA VONTADE DO ELEITOR. JURISPRUDÊNCIA. DESPROVIMENTO.
1- Recurso aviado contra sentença de improcedência em AIME fundada na alegação de fraude à cota de gênero, levada a cabo mediante suposta simulação de uma candidatura feminina, em ordem a burlar o comando inserto no art. 10, § 3º, da Lei n 9.504/1997 (Lei das Eleições).
- Da prejudicial de nulidade processual
2- Não é porque se cogita de conexão que dois ou mais processos necessariamente deverão ser instruídos e julgados em conjunto. Desde que estejam assegurados os já indicados valores da harmonia entre os julgados e da economia processual, a incidência do efeito da reunião de processos consubstancia escolha do magistrado, o qual, observando os requisitos legais, deverá analisar a oportunidade e a conveniência de fazê-lo. Precedentes. (TSE, AIJE nº 0601779-05.2018.6.00.0000/DF. j. 9.2.2021, rel. Min. Luis Felipe Salomão, DJe 11.3.2021).
- Prefacial de requerimento de juntada de documentos em fase recursal
3- Após o encerramento da fase instrutória, a rigor, não mais se mostra possível a produção de provas pelas partes, porquanto operado o fenômeno preclusivo. Destarte, não devem ser conhecidos os novos documentos, referentes a fatos antigos, juntados com o recurso.(TRE/RN, AIME nº 1-38/Luis Gomes, j. 8.5.2014, Juiz Carlo Virgílio Fernandes de Paiva, DJe 13.5.2014).
- Da fraude à cota de gênero - requisitos para condenação
4- Como é cediço, o regramento contido no art. 10, § 3º, da Lei nº 9.504/1997 (Lei das Eleições) que estatuiu percentuais mínimo e máximo de gênero no âmbito das candidaturas proporcionais, a serem observados por cada partido político no momento dos requerimentos de registro de candidaturas, bem como em eventual preenchimento de vagas remanescentes ou na substituição de candidatos (AgR-REspe nº 1608-92/PR, j. 11.11.2014, rel. Min. Gilmar Mendes, PSESS) — constitui “relevante mecanismo que visa assegurar a efetiva participação feminina nas eleições” (TSE, AgR-REspEl nº 799-14.2016.6.26.0240/SP, j. 21.5.2019, rel. Min. Jorge Mussi, DJe 27.6.2019), contexto em que a burla a esse sistema de cota representa grave afronta aos “princípios da igualdade, da cidadania e do pluralismo político” (TSE, REspEl nº 764-55/PR, j. 6.5.2021, rel. Min. Alexandre de Moraes, DJe 18.5.2021).
5- Em razão da gravidade das sanções previstas, a condenação estribada na fraude à cota de gênero reclama a presença de um conjunto probatório robusto e coeso, do qual se possa extrair, com a necessária certeza, “que os registros de candidaturas femininas tiveram o objetivo precípuo de burlar o telos subjacente ao § 3º do art. 10 da Lei nº 9.504/97” (REspe nº 0602016-38/PI, j. 4.8.2020, rel. Min. Tarcisio Vieira de Carvalho Neto, DJe 1º.9.2020).
6- Diante de dúvida razoável sobre o propósito previamente deliberado de fraudar a regra que exige a reserva de vagas por gênero no registro de candidaturas, é de rigor privilegiar o princípio do in dubio pro sufragio, sob o signo do qual não é dado à Justiça Eleitoral atribuir relevo e eficácia a juízos meramente conjecturais, para, com fundamento neles, apoiar um inadmissível decreto de cassação do diploma (TRE/RN, RE nº 0600109-98.2020.6.20.0033/Mossoró, j. 25.8.2022, de minha relatoria, DJe 29.8.2022).
- Caso concreto
7- Com efeito, na presente hipótese, a prova coligida, embora traga a lume relevantes circunstâncias indiciárias, não se reveste de robustez a demonstrar o “propósito previamente deliberado de fraudar”, cenário em que incide o entendimento jurisprudencial vigente no âmbito desta Corte Eleitoral, de acordo com o qual “a falta de propaganda eleitoral, de movimentação de recursos ou a votação zerada não são elementos aptos a, por si sós, deixarem evidente a prática de fraude à lei.” (TRE/RN, RE nº 0600421-28.2020.6.20.0016/São Bento do Trairi, j. 24.3.2022, rel. Desembargador Claudio Manoel de Amorim Santos, DJe 28.3.2022).
8- Nos termos da jurisprudência, é legítima a “valoração de depoimento de informante, de acordo com o método da livre persuasão racional, quando as informações prestadas são confirmadas pelo restante do acervo probatório produzido sob o contraditório judicial.” (AgR-REspe nº 0000138-77.2016.6.08.0000/ES, j. 28.4.2020, rel. Min. Og Fernandes, DJe 9.6.2020).
9- O recorrente, impugnante na origem, não logrou fazer prova de suas alegações, consoante a prescrição inscrita no art. 373, I, do CPC, sob o influxo da qual este Tribunal firmou que, em todas as demandas que podem acarretar a negação do registro e a cassação do diploma ou mandato eletivo, esse ônus processual compete inteiramente à parte demandante (RE nº 0600062-39.2021.6.20.0000/Natal, j. 12.5.2022, rel. Juíza Adriana Cavalcanti Magalhães Faustino Ferreira, DJe 16.5.2022).
10- Recurso a que se nega provimento. Manutenção da sentença de improcedência.
(RECURSO Eleitoral Nº 060000561, Acórdão de 01/09/2022, Rel. Juiz Fernando de Araújo Jales Costa, publicado no Diário da Justiça Eletrônico de 05/09/2022)
No mesmo sentido:
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ELEIÇÕES 2020. RECURSO ELEITORAL. AÇÃO DE IMPUGNAÇÃO DE MANDATO ELETIVO - AIME (ART. 14, §§ 10 E 11, DA CF). FRAUDE. BURLA À COTA DE GÊNERO (ART. 10, § 3º, DA LEI DAS ELEIÇÕES). SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA. SUPOSTA SIMULAÇÃO DE UMA CANDIDATURA FEMININA. ALEGAÇÕES DE VOTAÇÃO INEXPRESSIVA, INEXISTÊNCIA DE PROPAGANDA ELEITORAL E MOVIMENTAÇÃO CONTÁBIL. NÃO DEMONSTRAÇÃO DO ILÍCITO. AUSÊNCIA DE PROVA ROBUSTA ACERCA DO PRÉVIO E DELIBERADO INTENTO FRAUDULENTO. PRESENÇA APENAS DE ELEMENTOS INDICIÁRIOS. INCOMPATIBILIDADE COM O DECRETO CONDENATÓRIO PERSEGUIDO. INCIDÊNCIA DO PRINCÍPIO DO "IN DUBIO PRO SUFFRAGIUM". PRESERVAÇÃO DA SOBERANA VONTADE DO ELEITOR. JURISPRUDÊNCIA. DESPROVIMENTO.
(...)
6- Com efeito, o entendimento perfilhado na r. sentença recorrida não merece reparos, uma vez que as circunstâncias do caso concreto são inaptas a denotar, de forma inequívoca, que o registro da candidatura apontada como fictícia foi promovido com o objetivo precípuo de burlar o telos subjacente ao art. 10, § 3º, da Lei das Eleições, consoante exige a jurisprudência. Ora, a candidata dita fictícia ingressou na disputa eleitoral no limite do prazo legal (candidatura substituta), tendo-lhe restado exíguo lapso temporal para fazer a sua campanha, fato que explica - à luz do que ordinariamente acontece - a estranheza das circunstâncias que indicam de maneira mais consistente a fraude nesta via apurada, quais sejam: votação inexpressiva, ausência de movimentação contábil, desconhecimento por parte das testemunhas ouvidas em juízo acerca da existência da candidatura.
7- Logo, a grei recorrente, impugnante na origem, não se desincumbiu de seu ônus probatório, nos termos da prescrição inscrita no art. 373, I, do CPC, sendo de rigor a manutenção da r. sentença de improcedência, mercê do princípio do in dubio pro suffragium, sob o signo do qual não é dado à Justiça Eleitoral "atribuir relevo e eficácia a juízos meramente conjecturais, para, com fundamento neles, apoiar um inadmissível decreto de cassação do diploma' (REspe nº 21.264/AP, rel. Min. Carlos Velloso, julgado em 27.4.2004)." (TSE, ED-REspe nº 587-38/SP, j. 25.10.2016, rel. originário Min. Herman Benjamin, rel. designado Min. Gilmar Mendes, DJe 20.3.2017).
8- Recurso a que se nega provimento.
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ELEIÇÕES 2020. RECURSO ELEITORAL. AÇÃO DE IMPUGNAÇÃO DE MANDATO ELETIVO - AIME (ART. 14, §§ 10 E 11, DA CF). FRAUDE. BURLA À COTA DE GÊNERO (ART. 10, § 3º, DA LEI DAS ELEIÇÕES). SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA. SUPOSTA SIMULAÇÃO DE UMA CANDIDATURA FEMININA. ALEGAÇÕES DE VOTAÇÃO PÍFIA, INEXISTÊNCIA DE PROPAGANDA ELEITORAL E MOVIMENTAÇÃO CONTÁBIL. NÃO DEMONSTRAÇÃO DO ILÍCITO. PROVAS QUE MILITAM EM SENTIDO OPOSTO, DANDO CONTA DE UMA CANDIDATURA SINCERA, AINDA QUE MEDIANTE UMA CAMPANHA SINGELA. IMPUTAÇÃO ANCORADA EM MERA ESPECULAÇÃO. INCOMPATIBILIDADE COM O DECRETO CONDENATÓRIO PERSEGUIDO. DESPROVIMENTO.
1- Como fundamento autônomo para o ajuizamento da AIME (art. 14, §§ 10 e 11, da CF), a fraude tem conceito aberto e deve ser interpretada "de forma ampla, não se limitando às questões atinentes ao processo de votação" (TSE, AgR-REspe nº 0000557-49/MG, rel. Min. Edson Fachin, DJe 16.9.2019), podendo "englobar todas as situações em que a normalidade das eleições e a legitimidade do mandato eletivo são afetadas por ações fraudulentas, inclusive nos casos de fraude à lei" (TSE, REspe nº 1-49/PI, rel. Min. Henrique Neves da Silva, DJe 21.10.2015), o que abarca, decerto, a imputação de burla ao art. 10, § 3º, da Lei 9.504/1997 (Lei das Eleições), cuja ratio "é ampliar a participação das mulheres no processo político-eleitoral", com vistas à concretização dos "princípios da igualdade, da cidadania e do pluralismo político" (TSE, REspe nº 764-55/PR, j. 6.5.2021, rel. Min. Alexandre de Moraes, DJe 18.5.2021).
2- "A jurisprudência do colendo TSE firmou-se no sentido de que, apesar do importante papel da Justiça Eleitoral na apuração de condutas tendentes a ludibriar o sistema previsto no art. 10, § 3º, da Lei nº 9.504/1997 (Lei das Eleições), a prova da fraude à cota de gênero deve ser robusta e levar em conta a soma das circunstâncias do caso a denotar que o requerimento das candidaturas femininas foi levado a efeito com o objetivo precípuo de burlar o telos subjacente ao referido preceptivo legal." (TRE/RN, RE nº 0601081-37/Vila Flor, j. 13.10.2021, rel. Juiz Fernando de Araújo Jales Costa, DJe 15.10.2021). Nesse sentido, confiram-se: TRE/RN, RE nº 600541- 10.2020.620.0004/Natal, j. 21.10.2021, do mesmo relator, DJe 26.10.2021; TSE, AgR-REspEl nº 0602033-74/PI, rel. Min. Tarcisio Vieira de Carvalho Neto, DJe 2.12.2020; e REspe nº 0602016-38 /PI, do mesmo relator, DJe 1º.9.2020.
3- "Esta Corte Regional, inclusive em sede de julgamentos de feitos oriundos do pleito de 2020, assentou entendimento de que votações consideradas ínfimas e a eventual ausência de movimentação de recursos de campanha, 'mesmo quando em contexto com a singeleza do engajamento na disputa político-eleitoral, constituem circunstâncias meramente indiciárias, as quais, conquanto possam render ensejo à apuração dos fatos sob a ótica da fraude/abuso, não são suficientes para, isoladamente (i. e., sem a corroboração por outros elementos objetivos de convicção), induzir à segura conclusão de que houve o registro de candidaturas com o intuito deliberado de burlar a política afirmativa estabelecida no art. 10, § 3º, da Lei das Eleições, até porque a desistência tácita de participar do pleito por motivos íntimos e pessoais constitui hipótese factível, circunscrita ao plano da experiência ordinária.' (TRE/RN, RE nº 0600576-76/Natal, j. 5.10.2021, rel. Juiz Fernando de Araújo Jales Costa, DJe 7.10.2021). Nessa mesma linha são os seguintes precedentes: RE nº 0600122-97.2020.620.0033/Mossoró, j. 9.12.2021, rel. Juiz Fernando de Araújo Jales Costa, DJe 21.1.2022; RE nº 0600541-10.2020.6.20.0004/Natal, j. 21.10.2021, do mesmo relator, DJe 26.10.2021." (Recurso Eleitoral nº 0600115-08.2020.620.0033 /Mossoró, j. 10.3.2022, de minha relatoria, DJe 15.3.2022).
4- Na espécie, a prova coligida, quando muito, dá azo tão somente a um juízo de presunção quanto à propagada burla à cota de gênero, o que, como visto acima, não se coaduna com os parâmetros da jurisprudência para o acolhimento da pretensão condenatória buscada na presente via impugnativa. A uma, porque a candidata apontada como fictícia, mesmo obtendo apenas 8 (oito) votos, não foi a candidata menos votada da legenda. A duas (e mais determinantemente), porque restou demonstrado que, diferentemente do quanto alegado pelo recorrente, houve sim, ainda que de forma singela, movimentação de recursos e realização de atos típicos de campanha, como por exemplo, postagens em redes sociais, propaganda em rádio, aquisição de impressos ("santinhos").
5- Recurso a que se nega provimento.
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RECURSO ELEITORAL. AIME. ELEIÇÕES 2020. FRAUDE. CANDIDATURA FEMININA FICTÍCIA. AUSÊNCIA DE VOTOS. AUSÊNCIA DE ATOS DE CAMPANHA. AUSÊNCIA DE MOVIMENTAÇÃO FINANCEIRA. PRESTAÇÃO DE CONTAS COM MOVIMENTAÇÃO FINANCEIRA. PARTICIPAÇÃO EM REUNIÕES E NA CONVENÇÃO PARTIDÁRIA. CONTRATAÇÃO DE MATERIAL IMPRESSO DE PROPAGANDA ELEITORAL. ILICITUDE NÃO COMPROVADA. DEMONSTRAÇÃO DA PRÁTICA DE ATOS DE CAMPANHA. FRAUDE NÃO COMPROVADA. PRECEDENTES. REFORMA DA SENTENÇA. IMPROCEDÊNCIA DA AÇÃO. PROVIMENTO DO RECURSO.
Cinge-se a controvérsia à suposta ocorrência de fraude à cota de gênero pelo órgão municipal do Partido Socialista Brasileiro - PSB, do município de Ceará-Mirim/RN, nas Eleições Municipais de 2020, sob a alegação de ter se utilizado, na chapa proporcional, de candidaturas femininas fictícias, com o fito de burlar o comando normativo contido no art. 10, § 3º, da Lei nº 9.504/97.
Na espécie, o Douto Magistrado sentenciante, em substanciosa fundamentação, acolheu a tese sustentada pelo autor da ação quanto à ocorrência de fraude à reserva de gênero nas candidaturas apresentadas pelo partido impugnado, no município de Ceará-Mirim/RN, pois as candidatas ANACI PEREIRA DE OLIVEIRA e VALDILAINE CRUZ DE LIMA não teriam obtido votos nas eleições municipais de 2020, tampouco realizado atos de campanha, desistindo da disputa pelo mesmo motivo, sem comunicação ao partido e à Justiça Eleitoral, e, ainda, por terem contratado despesa após a aludida desistência.
Na hipótese vertente, o delineamento fático extraído dos autos não demonstra de forma contundente o cometimento de ilícito, pois apenas a falta de votos ou de atos significativos de campanha é insuficiente à caracterização da fraude alegada, especialmente porque é admissível a desistência tácita do pleito por motivos íntimos e pessoais, impassíveis de controle pela agremiação partidária ou pelo Poder Judiciário, de modo a obstar a dedução do ardil com base em meras presunções e indícios, sem que se comprove efetivamente a má-fé ou o prévio ajuste de vontades no propósito de burlar a norma em apreço. Nesse sentido: AgR-REspe nº 799-14/SP, Rel. Min. Jorge Mussi, DJe de 27.6.2019.
A jurisprudência das Cortes Eleitorais é firme no sentido de que a ausência ou baixa movimentação financeira, assim como a ausência ou a baixa votação nas urnas, embora configurem indícios hábeis a justificar uma investigação mais aprofundada, não constituem motivo suficiente, por si só, para caracterizar burla ou fraude à norma, sob pena de se restringir o exercício de direitos políticos com base em mera presunção. Observa-se que as candidatas supostamente "laranjas" tiveram, sim, movimentação financeira de valor não irrisório. Na verdade, restou evidenciado que elas efetivamente receberam recursos da agremiação, oriundos dos fundos públicos de financiamento, para emprego em suas campanhas, nos montantes de R$ 1.000,00 para Valdilaine Cruz de Lima e de R$ 900,00 para Anaci Pereira de Oliveira, verbas que foram utilizadas para custear material impresso de propaganda eleitoral.
Ao contrário do que entendeu o Juízo a quo, a contratação da aludida despesa não se deu somente após a desistência das suas candidaturas, o que decerto configuraria fraude, mas sim, em momento anterior, havendo nos autos documentos a demonstrar a negociação com a empresa gráfica contratada para prestar o serviço em 30/09/2021, isto é, logo após a deflagração do início da campanha eleitoral, quando o responsável do partido encaminha e-mail ao representante da empresa contendo em anexo as imagens dos impressos a serem produzidos para cada um dos candidatos da sua chapa, dentre esses, as candidatas Anaci e Valdilaine.
Ao serem ouvidas em Juízo, ambas as candidatas foram enfáticas em declarar o desejo pessoal de se lançarem candidatas no pleito municipal, seja por inspiração no histórico de participação de familiares na política (Anaci), seja pelo engajamento prévio em projetos sociais (Valdilaine).
De igual forma, não prosperam as alegações da ausência absoluta de envolvimento das candidatas em atos de campanha, tendo em vista que as fotos e a ata da convenção partidária do PSB de Ceará-Mirim juntada aos autos atestam a presença de Valdilaine Cruz de Lima e Anaci Pereira de Oliveira no evento político. De igual forma, também constam dos autos imagens de publicações realizadas no Facebook do PSB de Ceará-Mirim/RN noticiando a pré-candidatura de Valdilaine Cruz, bem como se encontram presentes imagens de santinhos, bottons, adesivos e bandeiras das aludidas candidatas, a comprovar a prática de atos típicos de campanha eleitoral.
Nesse cenário, ante a inexistência de prova robusta da existência de prévio ajuste de vontades ao tempo do pedido de registro de candidaturas, do oferecimento ou da aceitação de qualquer espécie de vantagem, ou ainda da má-fé por parte dos candidatos ou da agremiação recorrente, impõe-se a reforma da sentença recorrida.
Recurso conhecido e provido para reformar a sentença e julgar improcedente a ação de impugnação de mandato eletivo proposta.
No mesmo sentido:
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ELEIÇÕES 2020. RECURSO ELEITORAL. AÇÃO DE IMPUGNAÇÃO DE MANDATO ELETIVO (AIME). FRAUDE. BURLA À COTA DE GÊNERO (ART. 10, § 3º, DA LEI DAS ELEIÇÕES). IMPROCEDÊNCIA EM PRIMEIRA INSTÂNCIA. ARGUIÇÃO DE SIMULAÇÃO DE CANDIDATURA FEMININA. REGISTRO INDEFERIDO ANTE O IMPEDIMENTO DE OBTENÇÃO DE QUITAÇÃO ELEITORAL (NÃO PRESTAÇÃO DE CONTAS RELATIVAS AO PLEITO DE 2018). ALEGAÇÃO DE CIÊNCIA PRÉVIA DA AGREMIAÇÃO QUANTO À INVIABILIDADE DA CANDIDATURA. OUTRAS CIRCUNSTÂNCIAS: PÍFIA VOTAÇÃO, AUSÊNCIA DE ATOS TÍPICOS DE CAMPANHA E DE MOVIMENTAÇÃO CONTÁBIL. REJEIÇÃO DA TESE RECURSAL. NÃO EVIDENCIADO O ESPECIAL FIM DE AGIR CONSISTENTE NA DEMONSTRAÇÃO DE QUE O REGISTRO DA CANDIDATURA FORA REQUERIDO COM O OBJETIVO PRECÍPUO DE FRAUDAR A NORMA QUE ESTABELECE A POLÍTICA AFIRMATIVA EM FOCO. ELEMENTO NUCLEAR DO ILÍCITO APURADO. PRECEDENTES. NECESSIDADE DE PROVA ROBUSTA. PRESENÇA DE CIRCUNSTÂNCIAS MERAMENTE INDICIÁRIAS. INCOMPATIBILIDADE COM O DECRETO CONDENATÓRIO PERSEGUIDO. PRECEDENTES. DESPROVIMENTO.
1- A Ação de Impugnação de Mandato Eletivo - AIME (CF, art. 14, §§ 10 e 11), mercê de sua índole constitucional, ocupa uma posição preferencial em relação às demais ações eleitorais, nela comportando a apuração, sob o rito ordinário previsto na LC nº 64/1990 (arts. 2º a 7º), de variadas hipóteses de abuso do poder econômico, corrupção ou fraude, resultando, em caso de procedência, na cassação do diploma ilegitimamente obtido por algum desses vícios (TSE: REspe nº 1528-45/SP, j. 22.11.2016, rel. Min. Luiz Fux, DJe 2.6.2017; AIJE nº 1943-58/DF, j. 4.4.2017, rel. Min. Herman Benjamin, DJe 29.5.2017).
2- "A fraude à cota de gênero de candidaturas femininas representa afronta aos princípios da igualdade, da cidadania e do pluralismo político, na medida em que a ratio do art. 10, § 3º, da Lei 9.504/1997 é ampliar a participação das mulheres no processo político-eleitoral." (TSE, REspEl nº 764-55/PR, j. 6.5.2021, rel. Min. Alexandre de Moraes, DJe 18.5.2021).
3- A jurisprudência do colendo TSE firmou-se no sentido de que, apesar do importante papel da Justiça Eleitoral na apuração de condutas tendentes a ludibriar o sistema previsto no art. 10, § 3º, da Lei nº 9.504/1997 (Lei das Eleições), a prova da fraude à cota de gênero deve ser robusta e levar em conta a soma das circunstâncias do caso a denotar que o requerimento das candidaturas femininas foi levado a efeito com o objetivo precípuo de burlar o telos subjacente ao referido preceptivo legal. Nesse sentido, confiram-se: AgR-REspEl nº 0602033-74/PI, rel. Min. Tarcisio Vieira de Carvalho Neto, DJe 2.12.2020; REspe nº 0602016-38/PI, rel. Min. Tarcisio Vieira de Carvalho Neto, DJe 1º.9.2020).
4- Em recentíssimo julgado, esta Corte regional, em sintonia com a orientação jurisprudencial vigente no âmbito do Tribunal Superior Eleitoral e na linha de precedente próprio, assentou que "a votação pífia ou mesmo zerada e a ausência de movimentação de recursos de campanha, mesmo quando em contexto com a singeleza do engajamento na disputa político-eleitoral, constituem circunstâncias meramente indiciárias, as quais, conquanto possam render ensejo à apuração dos fatos sob a ótica da fraude/abuso, não são suficientes para, isoladamente (i. e., sem a corroboração por outros elementos objetivos de convicção), induzir à segura conclusão de que houve o registro de candidaturas com o intuito deliberado de burlar a política afirmativa estabelecida no art. 10, § 3º, da Lei das Eleições, até por que a desistência tácita de participar do pleito por motivos íntimos e pessoais constitui hipótese factível, circunscrita ao plano da experiência ordinária." (TRE/RN, RE nº 0600576-76/Natal, j. 5.10.2021, de minha relatoria, DJe 7.10.2021).
5- Na espécie, do exame do acervo probatório carreado aos autos, observa-se inexistir qualquer elemento objetivo de convicção a corroborar a tese de que o grêmio partidário tinha prévia ciência da inviabilidade da candidatura apontada como fictícia, não transpondo a alegação do recorrente nesse sentido a epiderme das primeiras impressões, circunscritas ao campo da mera especulação. A seu turno, as demais circunstâncias elencadas como denotadoras da suposta fraude, dando conta da ausência de atos próprios de campanha (propaganda, gastos eleitorais etc.), não se mostram aptas, mesmo em seu conjunto, a descortinar um cenário de certeza quanto à existência do deliberado e prévio intento fraudulento cogitado.
6- Recurso a que se nega provimento.
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ELEIÇÕES 2020. RECURSO ELEITORAL. AÇÃO DE IMPUGNAÇÃO DE MANDATO ELETIVO - AIME. ALEGAÇÃO DE FRAUDE À COTA DE GÊNERO. CANDIDATURA FEMININA. FRAGILIDADE DO CONJUNTO PROBATÓRIO APRESENTADO NOS AUTOS. PARTICIPAÇÃO DA CANDIDATA EM ATOS DE CAMPANHA, PRODUÇÃO DE MATERIAL PUBLICITÁRIO, GASTOS DECLARADOS NA PRESTAÇÃO DE CONTAS. FRAUDE NÃO CONFIGURADA. MANUTENÇÃO DA SENTENÇA QUE ORA SE IMPÕE. DESPROVIMENTO DO RECURSO.
- A Ação de Impugnação de Mandato Eletivo está disciplinada no artigo 14, §§ 10 e 11 da Constituição Federal.
- Da análise do caderno processual, não se extrai o intuito deliberado por parte da agremiação ora recorrida de burlar o preceito contido no supracitado artigo 10, § 3º da Lei das Eleições.
- No caso, observa-se que a candidata Alycia Cordeiro participou ativamente da campanha eleitoral, tendo confeccionado material publicitário (bottons), usado vestimenta nas cores representativas de sua agremiação (amarelo e azul) e discursado em um comício pedindo votos para si e para os candidatos da chapa majoritária de seu partido.
- Os fatos de a candidata ter recebido apenas um voto, de supostamente não ter utilizado redes sociais para divulgação de sua candidatura, o que é contraditado pelas provas constantes nos autos, e de ter apresentado gastos módicos em sua campanha eleitoral, não constituem provas robustas e irrefutáveis para configurar burla à norma, nem tampouco desnaturam a sua participação no pleito, mormente por se tratar de uma estudante que, ao que parece, estava iniciando a sua vida política.
- Ademais, no que se refere à prova testemunhal, esta também se mostra frágil a indicar a alegada fraude, vez que as testemunhas arroladas pelos ora recorrentes, embora tentem descaracterizar a candidatura de Alycia Cordeiro, dizendo que não viram propaganda eleitoral da candidata pela cidade, confirmam a participação desta em todas as manifestações políticas e em um comício e, mesmo que aleguem que esta só pediu votos para o seu pai - Junior de Mourão, também candidato a vereador - e para a coligação, não é isso que está demonstrado no vídeo colacionado ao processo.
- É assente na jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral e das Cortes Regionais pátrias, que "a prova de fraude na cota de gênero deve ser robusta e levar em conta a soma das circunstâncias fáticas do caso, a denotar o incontroverso objetivo de burlar o mínimo de isonomia entre homens e mulheres que o legislador pretendeu assegurar no art. 10, §3º, da Lei 9.504/97" (TSE; Recurso Ordinário Eleitoral nº 060169322, Relator Min. Luis Felipe Salomão, DJE de 22/04/2021).
- Desprovimento do recurso.
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ELEIÇÕES 2020. RECURSO ELEITORAL. AÇÃO DE IMPUGNAÇÃO DE MANDATO ELETIVO (AIME). FRAUDE. BURLA À COTA DE GÊNERO (ART. 10, § 3º, DA LEI DAS ELEIÇÕES). IMPROCEDÊNCIA EM PRIMEIRA INSTÂNCIA. SIMULAÇÃO DE CANDIDATURAS FEMININAS. ALEGAÇÕES DE PÍFIA VOTAÇÃO, AUSÊNCIA DE ATOS DE CAMPANHA E MOVIMENTAÇÃO E PARENTESCO COM OUTRO CANDIDATO. REJEIÇÃO. FORMALIZAÇÃO DE CANDIDATURA COM O OBJETIVO PRECÍPUO DE FRAUDAR À NORMA QUE ESTABELECE A POLÍTICA AFIRMATIVA EM FOCO. ELEMENTO NUCLEAR DO ILÍCITO APURADO. NÃO DEMONSTRAÇÃO. NECESSIDADE DE PROVA ROBUSTA. PRESENÇA DE CIRCUNSTÂNCIAS MERAMENTE INDICIÁRIAS. INCOMPATIBILIDADE. PRECEDENTES. DESPROVIMENTO.
1- A Ação de Impugnação de Mandato Eletivo - AIME (CF, art. 14, §§ 10 e 11), mercê de sua índole constitucional, ocupa uma posição preferencial em relação às demais ações eleitorais, nela comportando a apuração, sob o rito ordinário previsto na LC nº 64/1990 (arts. 2º a 7º), de variadas hipóteses de abuso do poder econômico, corrupção ou fraude, resultando, em caso de procedência, na cassação do diploma ilegitimamente obtido por algum desses vícios (TSE: REspe nº 1528-45/SP, j. 22.11.2016, rel. Min. Luiz Fux, DJe 2.6.2017; AIJE nº 1943-58/DF, j. 4.4.2017, rel. Min. Herman Benjamin, DJe 29.5.2017).
2- "A fraude à cota de gênero de candidaturas femininas representa afronta aos princípios da igualdade, da cidadania e do pluralismo político, na medida em que a ratio do art. 10, § 3º, da Lei 9.504/1997 é ampliar a participação das mulheres no processo político-eleitoral." (TSE, REspEl nº 764-55.2016.6.16.0071/PR, j. 6.5.2021, rel. Min. Alexandre de Moraes, DJe 18.5.2021).
3- A jurisprudência do c. TSE firmou-se no sentido de que, "apesar do importante papel da Justiça Eleitoral na apuração de condutas que objetivam burlar o sistema previsto no art. 10, § 3º, da Lei nº 9.504/97, a prova da fraude à cota de gênero deve ser robusta e levar em conta a soma das circunstâncias do caso a denotar o inequívoco fim de mitigar a isonomia entre homens e mulheres que o legislador pretendeu garantir" (AgR-REspEl nº 0602033-74/PI, rel. Min. Tarcisio Vieira de Carvalho Neto, DJe 2.12.2020), mediante o registro de candidaturas femininas levado a efeito com "o objetivo precípuo de burlar o telos subjacente ao [referido preceptivo legal]" (TSE, REspe nº 0602016-38/PI, rel. Min. Tarcisio Vieira de Carvalho Neto, DJe 1º.9.2020).
4- Em recentíssimo julgamento, esta Corte regional assentou, em sintonia com a orientação jurisprudencial vigente no âmbito do c. TSE e na linha de precedente próprio, que "a votação pífia ou mesmo zerada e a ausência de movimentação de recursos de campanha, mesmo quando em contexto com a singeleza do engajamento na disputa político-eleitoral, constituem circunstâncias meramente indiciárias, as quais, conquanto possam render ensejo à apuração dos fatos sob a ótica da fraude/abuso, não são suficientes para, isoladamente (i. e., sem a corroboração por outros elementos objetivos de convicção), induzir à segura conclusão de que houve o registro de candidaturas com o intuito deliberado de burlar a política afirmativa estabelecida no art. 10, § 3º, da Lei das Eleições, até por que a desistência tácita de participar do pleito por motivos íntimos e pessoais constitui hipótese factível, circunscrita ao plano da experiência ordinária." (TRE/RN, Recurso Eleitoral nº 0600576-76.2020.6.20.0001/Natal, j. 5.10.2021, de minha relatoria, DJe 7.10.2021).
5- Na espécie, a prova coligida é de cunho eminentemente indiciário, apta apenas a sustentar um juízo de presunção quanto a essa prévia deliberação de burlar a cota de gênero, o que, como visto, não se coaduna com os parâmetros da jurisprudência para o acolhimento da pretensão condenatória buscada nesta via.
6- Recurso a que se nega provimento.
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RECURSO ELEITORAL. AIME. FRAUDE. CANDIDATURA FEMININA FICTÍCIA. PRELIMINAR. INTEMPESTIVIDADE RECURSAL. REJEIÇÃO. MÉRITO. FRAUDE À RESERVA DE GÊNERO. CANDIDATA SUBSTITUTA. VAGA REMANESCENTE. NÚMERO REDUZIDO DE VOTOS. AUSÊNCIA DE ATOS DE CAMPANHA. AUSÊNCIA DE MOVIMENTAÇÃO FINANCEIRA. PRESTAÇÃO DE CONTAS COM MOVIMENTAÇÃO FINANCEIRA. RECEITA ESTIMÁVEL. VÍDEO. GRAVAÇÃO AMBIENTAL SEM CONHECIMENTO DE UM DOS INTERLOCUTORES. NÃO IDENTIFICAÇÃO DOS PARTICIPANTES. DIÁLOGO QUE NÃO COMPROVA A FRAUDE À COTA DE GÊNERO. DEMONSTRAÇÃO DA PRÁTICA DE ATOS DE CAMPANHA. PRESENÇA EM EVENTOS POLÍTICOS. LIVE DOS CANDIDATOS E DA COLIGAÇÃO. FRAUDE NÃO COMPROVADA. PRECEDENTES. MANUTENÇÃO DA SENTENÇA. DESPROVIMENTO DO RECURSO.
Preliminarmente, os recorridos pugnaram, em contrarrazões (ID 9968721), pelo reconhecimento da intempestividade recursal, por entender que a decisão judicial (ID 9968021) que julgou os embargos de declaração opostos em face da sentença, não os teria conhecido.
É cediço que os embargos de declaração, embora não possuam efeito suspensivo, interrompem o prazo para a interposição de recurso, a teor do que prescreve o art. 1.026 do CPC.
Com efeito, da leitura da aludida decisão, evidencia-se que o Douto Magistrado sentenciante conheceu dos aclaratórios para, no mérito, entendendo não caracterizada nenhuma das hipóteses de cabimento, prolatar decisão pela sua rejeição.
Nessa quadra, tendo em vista que os embargos interpostos efetivamente interromperam a contagem do prazo recursal, e que o subsequente recurso eleitoral foi protocolado dentro do prazo de 3 dias da data da publicação da respectiva decisão judicial, é de rigor o reconhecimento de sua tempestividade.
Preliminar rejeitada.
Cinge-se a controvérsia à suposta ocorrência de fraude à cota de gênero pelo órgão municipal do Democratas - DEM, do município de Martins/RN, nas Eleições Municipais de 2020, sob a alegação de ter se utilizado, na chapa proporcional, de candidatura feminina fictícia, com o fito de burlar o comando normativo contido no art. 10, § 3º, da Lei nº 9.504/97.
Trata-se da mesma situação fático-jurídica apreciada e debatida, à exaustão, nos autos do REl nº 0600239-73.2020.6.20.0038, em julgamento realizado na sessão do dia 03/08/2021. Desta feita, embora o ora recorrente e autor da demanda seja outro – Comissão Provisória Municipal do Partido dos Trabalhadores – PT de Martins/RN –, as alegações e os fundamentos são os mesmos tratados no processo anterior, a saber, a ocorrência de fraude à reserva de gênero nas candidaturas apresentadas pelo partido recorrido, no município de Martins/RN, pois a candidata MARIA AUXILIADORA REZENDE QUEIROZ não teria votado em si própria, não teria tido movimentação financeira, tampouco teria realizado atos de pré-campanha e, ainda, foi gravada em vídeo afirmando que a sua candidatura teria sido apenas para complementar a chapa do partido.
Nada obstante o Juízo a quo não ter procedido à reunião dos feitos, cumpre consignar que houve o deferimento pelo compartilhamento de provas, notadamente a prova testemunhal colhida em audiência (ID 9965621).
Nesse contexto, ainda que não se possa reconhecer a litispendência, por não haver identidade de partes, impõe-se o cuidado para que não haja julgamentos conflitantes sobre os mesmos fatos, mormente quando se constata que as provas coligidas são as mesmas.
Compulsando os autos, não é possível se concluir que tenha havido o propósito prévio e deliberado, por parte da agremiação impugnada, de fraudar o preceito normativo contido no art. 10, § 3º, da Lei das Eleições.
É certo que a moldura fática extraída dos autos não demonstra o cometimento de ilícito, pois apenas a falta de votos ou de atos significativos de campanha não é suficiente à caracterização da fraude alegada, especialmente porque é admissível a desistência tácita de participar do pleito por motivos íntimos e pessoais, não controláveis pela agremiação partidária ou pelo Poder Judiciário, de modo que não se pode deduzir o ardil com base em meras presunções e indícios, sem que se comprove efetivamente a má-fé ou o prévio ajuste de vontades no propósito de burlar a norma em apreço.
De antemão, já sobressai o fato de que o diretório municipal do DEM de Martins/RN, na formação de sua chapa proporcional, viabilizou inicialmente 12 candidaturas, das quais 08(oito) foram do sexo masculino e 4 (quatro) foram do sexo feminino. Ocorre que a Sra. Maria Auxiliadora não fez parte dessa composição inicial, seu ingresso na disputa eleitoral ocorreu em momento posterior, em 09/10/2020, portanto já no curso da campanha, em vaga remanescente aberta após a desistência de uma das demais candidatas, a Sra. Edna Maria Felix, formalizada em 08/10/2020.
Restou demonstrado pela prova coligida aos autos que a candidata Maria Auxiliadora realizou atos de campanha, consoante se observa de sua participação em “live” promovida pelo partido recorrido e pela coligação majoritária que apoiava, em 25/10/2020, que contou com a presença dos seus candidatos, transmitida pela internet e acessada pela plataforma Youtube, no link (https://www.youtube.com/watch?v=ARSLpfG1McI).
Quanto à tese recursal de fraude por ausência de movimentação financeira da candidata e por esta ter obtido apenas 1 (um) voto nas urnas, embora se constituam em indícios hábeis a justificar uma investigação mais aprofundada, não constituem motivo suficiente, por si só, para caracterizar burla ou fraude à norma, sob pena de se restringir o exercício de direitos políticos com base em mera presunção. Demais disso, importa dizer que a candidata não apresentou prestação de contas zerada, embora com singela movimentação, houve o registro de receita estimável em dinheiro no montante de R$ 130,62 (cento e trinta reais e sessenta e dois centavos).
No tocante ao vídeo acostado à exordial (ID 9963221), com o qual os recorrentes pretendiam comprovar a fraude no preenchimento da cota de gênero, por supostamente se referir a conversa travada entre a candidata Maria Auxiliadora Resende Queiroz e a Sra. Marinalva Leite da Cunha, faz-se necessário tecer as seguintes considerações.
Primeiramente, a aludida gravação foi realizada em ambiente escuro, com a câmera apontada para direção diversa a dos interlocutores, prejudicando a identificação das participantes no diálogo. Em segundo lugar, abstraindo-se do debate jurídico-constitucional, na seara eleitoral, quanto à licitude da prova obtida por gravação ambiental realizada por um dos interlocutores sem o conhecimento do outro, não se extrai do seu conteúdo prova cabal do conluio entre a “candidata” e a direção partidária, mesmo porque, em determinado momento da gravação, uma das participantes afirma que Olga (presidente do partido DEM) lhe disse para pedir voto, mas ela não pediu porque não quis.
Nessa ordem de ideias, levando-se em conta a ausência de prova robusta de fraude na cota de gênero, sobretudo em face da soma das circunstâncias fáticas do caso concreto, não se denota o incontroverso objetivo, por parte da agremiação partidária recorrida e de seus candidatos, de burlar a regra legal estabelecida no art. 10, § 3º, da Lei nº 9.504/97. Precedentes.
Recurso conhecido e desprovido.
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RECURSO ELEITORAL. AIME. JULGAMENTO EM CONJUNTO. FRAUDE. CANDIDATURA FEMININA FICTÍCIA. NÚMERO REDUZIDO DE VOTOS. AUSÊNCIA DE ATOS DE CAMPANHA. AUSÊNCIA DE MOVIMENTAÇÃO FINANCEIRA. DECLARAÇÃO DE APOIO À CANDIDATO ADVERSÁRIO. INSTRUÇÃO PROCESSUAL. PROVA DOCUMENTAL E TESTEMUNHAL. AUSÊNCIA DE PROVA ROBUSTA DA FRAUDE. FRAUDE NÃO COMPROVADA. PRECEDENTES. MANUTENÇÃO DA SENTENÇA. DESPROVIMENTO DO RECURSO.
De início, cumpre consignar que, tendo em vista as questões discutidas nos autos dos REl nºs 0601082-22 e 0601084-89 se reportarem ao mesmo contexto fático e jurídico, razão pela qual o Juízo a quo promoveu a reunião dos feitos e o seu julgamento em conjunto ante a evidente conexão, revela-se oportuna, de igual forma, o julgamento em conjunto dos recursos interpostos em ambas as ações.
Cinge-se a controvérsia à suposta ocorrência de fraude à cota de gênero pelo órgão municipal do Partido Democrático Trabalhista, do município de Canguaretama/RN, nas Eleições Municipais de 2020, sob a alegação de ter se utilizado, na chapa proporcional, de candidatura feminina fictícia, com o fito de burlar o comando normativo contido no art. 10, § 3º, da Lei nº 9.504/97.
Os recorrentes sustentaram a ocorrência de fraude à reserva de gênero nas candidaturas apresentadas pelo partido recorrido, no município de Canguaretama/RN, pois a candidata DANIELE DA SILVA OLIVEIRA, além de não fazer campanha para si, mas para outro candidato, não teria recebido doações financeiras, obtendo apenas 2 (dois) votos no pleito de 2020.
Compulsando os autos, não é possível se concluir que tenha havido o propósito prévio e deliberado, por parte da agremiação impugnada, de fraudar o preceito normativo contido no art. 10, § 3º, da Lei das Eleições.
É assente na jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral e das Cortes Regionais que a prova de fraude na cota de gênero deve ser robusta e levar em conta a soma das circunstâncias fáticas do caso, a denotar o incontroverso objetivo de burlar o mínimo de isonomia entre homens e mulheres que o legislador pretendeu assegurar no art. 10, § 3º, da Lei 9.504/97 (Recurso Ordinário Eleitoral nº 060169322, Relator Min. Luis Felipe Salomão, Publicação: DJE - Diário da justiça eletrônica, Tomo 71, Data 22/04/2021).
É certo que a moldura fática extraída dos autos não demonstra o cometimento de ilícito, pois apenas a falta de votos ou de atos significativos de campanha não é suficiente à caracterização da fraude alegada, especialmente porque é admissível a desistência tácita de participar do pleito por motivos íntimos e pessoais, não controláveis pela agremiação partidária ou pelo Poder Judiciário, de modo que não se pode deduzir o ardil com base em meras presunções e indícios, sem que se comprove efetivamente a má-fé ou o prévio ajuste de vontades no propósito de burlar a norma em apreço.
No tocante à tese recursal de fraude por ausência de movimentação financeira da candidata e por esta ter obtido apenas 2 (dois) votos nas urnas, embora se constituam em indícios hábeis a justificar uma investigação mais aprofundada, não constituem motivo suficiente, por si só, para caracterizar burla ou fraude à norma, sob pena de se restringir o exercício de direitos políticos com base em mera presunção.
No ponto, cumpre consignar que o diretório municipal do Partido Democrático Trabalhista de Canguaretama/RN não recebeu recursos do Fundo Partidário ou do Fundo Especial de Financiamento de Campanha para as Eleições Municipais de 2020, consoante se pode constatar em simples consulta ao site disponibilizado pelo TSE para a divulgação de candidaturas e prestações de contas de candidatos e partidos (www.divulgacandcontas.tse.jus.br).
Diante dessa constatação, é forçoso concluir que nenhum dos candidatos que disputaram o pleito proporcional pela aludida agremiação receberam verba pública para financiamento de suas campanhas, o que também pode ser facilmente aferível ao se consultar a prestação de contas de cada um deles no mesmo endereço eletrônico, afastando, portanto, a presunção de que a falta de repasse de recursos do partido para a candidata impugnada implicaria em fraude premeditada ou em candidatura de fachada.
Por sua vez, quanto ao fato de que a candidata Daniele da Silva Oliveira teria, por meio de postagem publicada em redes sociais, dado apoio a outra candidata, pertencente a partido diverso ao qual se encontrava filiada (Katia da Paz, nº 20.789, PSC), insta salientar que tal declaração de apoio não se deu em favor de outro candidato do partido impugnado, o que poderia revelar de forma mais contundente o conluio, mas sim em favor de candidata filiada à agremiação adversária, atuação que se mostra diametralmente contrária aos interesses do PDT, ao afastar os votos do eleitorado dos seus candidatos e da sua legenda, mormente quando se observa não mais haver coligação no pleito proporcional e a votação de cada partido ser considerada isoladamente para distribuição das cadeiras.
Na verdade, tal comportamento revela apenas uma mudança pessoal de posicionamento político da Sra. Daniele, inclusive em relação à viabilidade de sua própria candidatura, assemelhando-se mais a uma desistência tácita da disputa eleitoral, circunstância que refoge completamente à esfera de decisão e controle da direção partidária recorrida.
Extrai-se do arcabouço probatório colacionado a inexistência de propósito prévio e deliberado da direção partidária em fraudar a cota de gênero na campanha eleitoral de 2020, ainda mais quando se observa que a situação aqui examinada (baixa votação e ausência de movimentação financeira) muito se assemelha a diversos outros candidatos no pleito proporcional, de ambos os sexos, e sobre os quais não se imputou a pecha de candidatura laranja.
Nessa ordem de ideias, levando-se em conta a ausência de prova robusta de fraude na cota de gênero, sobretudo em face da soma das circunstâncias fáticas do caso concreto, não se denota o incontroverso objetivo, por parte da agremiação partidária recorrida e de seus candidatos, de burlar a regra legal estabelecida no art. 10, § 3º, da Lei nº 9.504/97. Precedentes.
Recurso conhecido e desprovido.
- No mesmo sentido:
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RECURSO ELEITORAL. AIME. FRAUDE. CANDIDATURA FEMININA FICTÍCIA. PRELIMINAR. TRÂNSITO EM JULGADO. REJEIÇÃO. INGRESSO DE TERCEIRO INTERESSADO. ASSISTÊNCIA SIMPLES. ADMISSÃO. MÉRITO. CANDIDATA SUBSTITUTA. VAGA REMANESCENTE. NÚMERO REDUZIDO DE VOTOS. AUSÊNCIA DE ATOS DE CAMPANHA. AUSÊNCIA DE MOVIMENTAÇÃO FINANCEIRA. PRESTAÇÃO DE CONTAS COM MOVIMENTAÇÃO FINANCEIRA. RECEITA ESTIMÁVEL. VÍDEO. GRAVAÇÃO AMBIENTAL SEM CONHECIMENTO DE UM DOS INTERLOCUTORES. NÃO IDENTIFICAÇÃO DOS PARTICIPANTES. DIÁLOGO QUE NÃO COMPROVA A FRAUDE À COTA DE GÊNERO. DEMONSTRAÇÃO DA PRÁTICA DE ATOS DE CAMPANHA. PRESENÇA EM EVENTOS POLÍTICOS. LIVE DOS CANDIDATOS E DA COLIGAÇÃO. FRAUDE NÃO COMPROVADA. PRECEDENTES. MANUTENÇÃO DA SENTENÇA. DESPROVIMENTO DO RECURSO.
Preliminarmente, os recorridos pugnaram, em contrarrazões (ID 9520371), pelo reconhecimento do trânsito em julgado da sentença, bem como pela inadmissibilidade do ingresso do Sr. Antonio Cortez Filho no feito, por entender intempestiva a sua intervenção, bem como por não deter legitimidade.
Compulsando os autos, observa-se que a sentença que julgou improcedente a demanda foi publicada em 15 de junho de 2021, consoante consulta à edição nº 123 do Diário da Justiça Eletrônico - DJe. Por sua vez, o recurso apresentado pelos autores da AIJE foi interposto em 17/06/2021, enquanto que o pedido de ingresso no feito, formulado pelo Sr. Antonio Cortez Filho, foi protocolado em 18/06/2021, portanto, ambos dentro do prazo legal de 3 dias para interposição de recurso, não havendo que se falar em trânsito em julgado da sentença.
Por outro lado, no tocante ao pedido de ingresso no feito, apresentado pelo Sr. Antonio Cortez Filho após a sentença (ID 9520171), observo que ainda não foi objeto de decisão judicial, de modo que passo a sua apreciação em conjunto com a preliminar de ilegitimidade arguida pelos recorridos. Nessas situações, a jurisprudência das Cortes Eleitorais e do Tribunal Superior Eleitoral é pacífica no sentido de que somente é admissível tais intervenções de terceiros na condição de assistente simples, haja vista tratar-se de suplente de vereador que somente seria atingindo pela decisão por via reflexa, com a eventual cassação de mandatos e recálculo do quociente eleitoral.
Preliminares rejeitadas. Admissão de terceiro na condição de assistente simples.
Cinge-se a controvérsia à suposta ocorrência de fraude à cota de gênero pelo órgão municipal do Democratas - DEM, do município de Martins/RN, nas Eleições Municipais de 2020, sob a alegação de ter se utilizado, na chapa proporcional, de candidatura feminina fictícia, com o fito de burlar o comando normativo contido no art. 10, § 3º, da Lei nº 9.504/97.
Os recorrentes sustentaram a ocorrência de fraude à reserva de gênero nas candidaturas apresentadas pelo partido recorrido, no município de Martins/RN, pois a candidata MARIA AUXILIADORA REZENDE QUEIROZ além de não ter votado em si própria, não realizou movimentação financeira bem como não realizou atos de pré-campanha e, ainda, foi gravada em vídeo afirmando que a sua candidatura teria sido apenas para complementar a chapa do partido.
Compulsando os autos, não é possível se concluir que tenha havido o propósito prévio e deliberado, por parte da agremiação impugnada, de fraudar o preceito normativo contido no art. 10, § 3º, da Lei das Eleições.
É certo que a moldura fática extraída dos autos não demonstra o cometimento de ilícito, pois apenas a falta de votos ou de atos significativos de campanha não é suficiente à caracterização da fraude alegada, especialmente porque é admissível a desistência tácita de participar do pleito por motivos íntimos e pessoais, não controláveis pela agremiação partidária ou pelo Poder Judiciário, de modo que não se pode deduzir o ardil com base em meras presunções e indícios, sem que se comprove efetivamente a má-fé ou o prévio ajuste de vontades no propósito de burlar a norma em apreço.
De antemão, já sobressai o fato de que o diretório municipal do DEM de Martins/RN, na formação de sua chapa proporcional, viabilizou inicialmente 12 candidaturas, das quais 08(oito) foram do sexo masculino e 4 (quatro) foram do sexo feminino. Ocorre que a Sra. Maria Auxiliadora não fez parte dessa composição inicial, seu ingresso na disputa eleitoral ocorreu em momento posterior, em 09/10/2020, portanto já no curso da campanha, em vaga remanescente aberta após a desistência de uma das demais candidatas, a Sra. Edna Maria Felix, formalizada em 08/10/2020.
Restou demonstrado pela prova coligida aos autos que a candidata Maria Auxiliadora realizou atos de campanha, consoante se observa de sua participação em live promovida pelo partido recorrido e pela coligação majoritária que apoiava, em 25/10/2020, que contou com a presença dos seus candidatos, transmitida pela internet e acessada pela plataforma Youtube, no link (https://www.youtube.com/watch?v=ARSLpfG1McI).
Quanto à tese recursal de fraude por ausência de movimentação financeira da candidata e por esta ter obtido apenas 1 (um) voto nas urnas, embora se constituam em indícios hábeis a justificar uma investigação mais aprofundada, não constituem motivo suficiente, por si só, para caracterizar burla ou fraude à norma, sob pena de se restringir o exercício de direitos políticos com base em mera presunção. Demais disso, importa dizer que a candidata não apresentou prestação de contas zerada, embora com singela movimentação, houve o registro de receita estimável em dinheiro no montante de R$ 130,62 (cento e trinta reais e sessenta e dois centavos).
Outrossim, no tocante ao vídeo acostado à exordial (ID 9514171), os quais os recorrentes alegam ser capaz de comprovar da fraude na cota de gênero, por supostamente se referir a conversa travada entre a candidata Maria Auxiliadora Resende Queiroz e a Sra. Marinalva Leite da Cunha, faz-se necessário tecer as seguintes considerações.
Primeiramente, a aludida gravação foi realizada em ambiente escuro, com a câmera apontada para direção diversa a dos interlocutores, prejudicando a identificação das participantes no diálogo. Demais disso, ao prestar depoimento em Juízo, a própria candidata Maria Auxiliadora negou ser sua uma das vozes ouvida no vídeo em comento (ID 9518571 e seguintes).
Em segundo lugar, abstraindo-se do debate jurídico-constitucional, na seara eleitoral, quanto à licitude da prova obtida por gravação ambiental realizada por um dos interlocutores sem o conhecimento do outro, não se extrai do seu conteúdo prova cabal do conluio entre a candidata e a direção partidária, mesmo porque em determinado momento da gravação, uma das participantes afirma que Olga (presidente do partido DEM) lhe disse para pedir voto, mas ela não pediu porque não quis.
Nessa ordem de ideias, levando-se em conta a ausência de prova robusta de fraude na cota de gênero, sobretudo em face da soma das circunstâncias fáticas do caso concreto, não se denota o incontroverso objetivo, por parte da agremiação partidária recorrida e de seus candidatos, de burlar a regra legal estabelecida no art. 10, § 3º, da Lei nº 9.504/97. Precedentes.
Recurso conhecido e desprovido.
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RECURSO ELEITORAL. AIME. FRAUDE. CANDIDATURA FEMININA FICTÍCIA. PRELIMINAR. JUNTADA DE DOCUMENTOS EM RAZÕES RECURSAIS. TENTATIVA DE REABERTURA DE INSTRUÇÃO PROCESSUAL. REPETIÇÃO DE FOTOS COLACIONADAS DESDE A EXORDIAL. REJEIÇÃO. NÚMERO REDUZIDO DE VOTOS. AUSÊNCIA DE ATOS DE CAMPANHA. AUSÊNCIA DE MOVIMENTAÇÃO FINANCEIRA. DECLARAÇÃO DE APOIO À CANDIDATO ADVERSÁRIO. INSTRUÇÃO PROCESSUAL. PROVA DOCUMENTAL E TESTEMUNHAL. DEMONSTRAÇÃO DA PRÁTICA DE ATOS DE CAMPANHA. PRESENÇA NA CONVENÇÃO PARTIDÁRIA E OUTROS EVENTOS POLÍTICOS. MATERIAL IMPRESSO DE PROPAGANDA. SANTINHOS. COMPROVAÇÃO. DECLARAÇÃO DE APOIO À CANDIDATO DIVERSO. FINAL DA CAMPANHA. MUDANÇA DE POSICIONAMENTO POLÍTICO. ESFERA DE CONTROLE E DECISÃO DO PARTIDO. IMPOSSIBILIDADE. FRAUDE NÃO COMPROVADA. PRECEDENTES. MANUTENÇÃO DA SENTENÇA. DESPROVIMENTO DO RECURSO.
Os recorridos pugnaram, em contrarrazões, pelo não conhecimento dos documentos inseridos nas razões recursais, caracterizando-se como uma tentativa de reabertura da instrução processual.
Debruçando-se sobre ambas as peças processuais (petição inicial e razões recursais), constata-se que as imagens colacionadas nas razões recursais não se constituem em novos documentos, pois já constavam dos autos desde a petição inicial. Trata-se, portanto, de mera repetição de prova produzida tempestivamente no curso natural do processo.
Preliminar rejeitada.
Cinge-se a controvérsia à suposta ocorrência de fraude à cota de gênero pelo órgão municipal do Partido Republicano da Ordem Social - PROS, do município de Canguaretama/RN, nas Eleições Municipais de 2020, sob a alegação de ter se utilizado, na chapa proporcional, de candidatura feminina fictícia, com o fito de burlar o comando normativo contido no art. 10, § 3º, da Lei nº 9.504/97.
O recorrente sustentou a ocorrência de fraude à reserva de gênero nas candidaturas apresentadas pelo partido recorrido, no município de Canguaretama/RN, pois a candidata MARIA CELIA DO NASCIMENTO, além de não fazer campanha para si, mas para outro candidato, não teria recebido doações financeiras, e obteve apenas 1 (um) voto no pleito de 2020.
Compulsando os autos, não é possível se concluir ter havido o propósito prévio e deliberado, por parte da agremiação impugnada, de fraudar o preceito normativo contido no art. 10, § 3º, da Lei das Eleições. De antemão, já sobressai o fato de que o diretório municipal do PROS de Canguaretama/RN, na formação de sua chapa proporcional, viabilizou inicialmente 20 candidaturas, das quais 13(treze) foram do sexo masculino e 7 (sete) foram do sexo feminino.
Diante dessa constatação, aplicando-se a regra legal de preenchimento mínimo de 30% das vagas para candidaturas de cada sexo, chega-se à conclusão de que o partido estava obrigado a lançar, nesta hipótese, o mínimo de 6 (seis) candidaturas femininas mas lançou 7 (sete) mulheres à disputa, de modo que o cumprimento do preceito legal restaria atendido mesmo com o indeferimento ou a desistência da candidata Maria Célia, a única sobre a qual se imputa a pecha de candidata laranja.
Ao ao contrário do que afirma o recorrente, restou demonstrado pela prova coligida aos autos não ter a candidata Maria Célia participado somente da convenção partidária, pois ela também esteve presente em eventos de campanha eleitoral.
De mais a mais, os impugnados colacionaram prova de material impresso de propaganda eleitoral em favor da aludida candidata, contendo o seu número de urna, sua foto e o seu nome.
Finalmente, a única testemunha ouvida em Juízo, a Sra. Adriana Carla Carvalho de Albuquerque, a qual atuou como uma das coordenadoras da campanha dos recorridos, foi enfática ao afirmar que a candidata Maria Célia praticou atos típicos de campanha eleitoral, fazendo-se presente e participando de várias caminhadas, reuniões e comícios. Afirmou, também, ter havido confecção e distribuição de santinhos contendo material publicitário da candidata e dos demais candidatos do grupo, informação, aliás, corroborada pelas fotos anexadas aos autos.
No tocante à tese recursal de fraude por ausência de movimentação financeira da candidata e por esta ter obtido apenas 1 (um) voto nas urnas, embora se constituam em indícios hábeis a justificar uma investigação mais aprofundada, não constituem motivo suficiente, por si só, para caracterizar burla ou fraude à norma, sob pena de se restringir o exercício de direitos políticos com base em mera presunção.
Quanto ao fato de que a candidata Maria Célia teria, por meio de vídeo publicado em redes sociais, dado apoio a outro candidato, pertencente a partido diverso ao qual se encontrava filiada (Danilo Gomes de Assis, nº 22111), faz-se necessário tecer as seguintes considerações. Insta destacar que o fato ocorreu em um único vídeo publicado nas redes sociais, em 03 de novembro de 2020, faltando apenas 12 dias para o pleito, portanto já transcorridos 33 dias do início do período eleitoral, na reta final da campanha. O próprio teor do discurso da então candidata, no aludido vídeo publicado, revela ter havido uma mudança do seu posicionamento político, e não uma intenção prévia e deliberada de fraudar a cota de gênero do PROS.
Chama especial atenção o fato de que tal declaração de apoio não se deu desde o início da campanha, tampouco em favor de outro candidato do partido impugnado, o que poderia revelar de forma mais contundente o conluio, mas apenas na reta final da campanha e em favor de candidato filiado à agremiação adversária, a revelar uma mudança pessoal de posicionamento político da Sra. Maria Célia, inclusive em relação à viabilidade de sua própria candidatura, assemelhando-se a uma desistência tácita da disputa eleitoral, circunstância que refoge completamente à esfera de decisão e controle da direção partidária recorrida, a qual se encontrava naquele momento, inclusive, impossibilitada de proceder à substituição da candidatura ante o exaurimento do prazo pelo calendário eleitoral.
Nessa ordem de idéias, levando-se em conta a ausência de prova robusta de fraude na cota de gênero, sobretudo em face das circunstâncias fáticas do caso concreto, não se denota o incontroverso objetivo, por parte da agremiação partidária recorrida e de seus candidatos, de burlar a regra legal estabelecida no art. 10, § 3º, da Lei nº 9.504/97. Precedentes.
Recurso conhecido e desprovido.
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